Tememos o exercício da paciência. Espremer o ar com os punhos em crosta. No estômago, emparelhamos volumes de ânsia. Esquecemos de cor. E porque não pisar também os próprios pés e não sentir nada, lavarmos as têmporas, os ouvidos, os lábios no coração gelado da terra?
Esperar. O exercício da paciência, semear cuidados gentis em todas as horas do corpo exausto, tentar ver as coisas bem pequenas empoleirado no topo do cérebro. Até perceber que a sinuosa teia onde assento os pés tem de ser sangrada com método para que se repercuta melhor o gesto de tudo afastar.
Longe estão já os depósitos de robustas paisagens que atravessámos, as estações de comboio que achámos invertidas, portos marítimos onde apenas tropeçam esqueletos de bicicletas e caroços de fruta, onde deslizam quilómetros de canções enoveladas em silêncio.
Vai-se tudo. Espremer o ar, os punhos em crosta. Não sei de onde brotou esta primeira gota de suor. Dois cabelos esbarram no meu ombro esquerdo enquanto me desvio, pouco hábil, de todo um caminho de frases inúteis. E é também com muita paciência que se aprende a enobrecer esta incapacidade de dizer as coisas.
in Breve passagem pelo fogo, Artefacto, Junho de 2011.
Relembramos que a apresentação do livro será sábado, dia 09 de Julho, pelas 18.30h, no Palácio Laguares (i.e., no novo espaço da Guilherme Cossoul). Pode, também, já enco-mendar o livro aqui.